DECISÃO
Inversão do ônus da prova na apelação exige nova oportunidade à parte
A inversão do ônus da prova é regra de instrução, devendo a decisão judicial que a determina ser proferida preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo a reabertura de oportunidade. Com esse entendimento, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso de Spaipa S/A Indústria Brasileira de Bebidas.
A empresa de bebidas recorreu de decisão da Terceira Turma do STJ que considerou a inversão do ônus da prova, de que trata o artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), uma regra de julgamento que pode ser estabelecida no momento em que o juiz proferir a sentença ou até mesmo pelo tribunal, ao apreciar a apelação – como no caso.
Segundo a empresa, a decisão do colegiado encontra-se em divergência com o entendimento da Quarta Turma do STJ, que concluiu que a referida lei inseriu regra de procedimento, que, como tal, deve ser determinada pelo juiz durante a instrução do feito e mediante decisão que examine fundamentadamente os requisitos exigidos em lei, de forma a propiciar a produção da prova à parte a quem foi dirigida a ordem judicial e que irá suportar as consequências processuais de sua eventual não produção.
O ministro João Otávio de Noronha, relator do processo, acolheu os embargos de divergência da Spaipa a fim de que, mantida a inversão do ônus da prova pelo tribunal de segunda instância, “o juízo de primeiro grau reabra a oportunidade para indicação de provas e realize a fase de instrução do processo”.
Em voto-vista, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino não conheceu dos embargos, mantendo a decisão da Terceira Turma. Segundo Sanseverino, é irrelevante a identificação do fabricante do produto defeituoso para o julgamento do recurso, primeiro, em razão da finalidade dos embargos de divergência de uniformizar a jurisprudência no âmbito do Tribunal e, depois, porque a providência demandaria reexame das provas do processo, vedado pela Súmula 7 do STJ.
Anulação desde a sentença
A ministra Maria Isabel Gallotti pediu vista. Ao dar prosseguimento ao julgamento, ela votou acolhendo os embargos de divergência para anular o processo desde a sentença e determinar ao juiz de primeiro grau que, caso considere presentes os requisitos da inversão do ônus da prova estabelecidos no artigo 6º do CDC, reabra a instrução, a fim de propiciar à Spaipa a oportunidade de comprovar não ser a fabricante da garrafa de Coca-cola adquirida pelo autor de ação de indenização.
Segundo a ministra, no caso em questão, o consumidor não demonstrou que a Spaipa fabricou o produto defeituoso e, portanto, é responsável pelo dano que alegou ter suportado. Assim, não há como aplicar as regras de apresentação de provas previstas no artigo 12 do CDC.
“Caberia a inversão do ônus de comprovar a identidade do fabricante do produto defeituoso, mas esta inversão tem por fundamento o artigo 6º do CDC, e deveria ter sido determinada pelo juiz, na fase de instrução, ou ao menos seguir-se da reabertura da instrução, a fim de dar oportunidade ao réu de demonstrar que não produziu, fabricou, construiu ou importou a mercadoria reputada defeituosa”, afirmou a ministra Gallotti.
Além dos ministros João Otávio de Noronha e Maria Isabel Gallotti, votaram pelo acolhimento dos embargos os ministros Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira e Villas Bôas Cueva. Os ministros Nancy Andrighi, Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão e Paulo de Tarso Sanseverino votaram pelo não conhecimento do recurso.
14/03/2012 - 17h11
INSTITUCIONAL
PEC da repercussão geral no STJ é entregue ao ministro da Justiça
O presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Ari Pargendler, entregou na tarde desta quarta-feira (14) ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a proposta de emenda constitucional (PEC) que institui a repercussão geral no STJ. O texto deverá ser encaminhado ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo. “A aprovação no Congresso com o apoio do Executivo é mais fácil”, acredita Pargendler.
O ministro da Justiça apoia o projeto, segundo informou o ministro Ari Pargendler. “Já havíamos conversado antes com o ministro José Eduardo Cardozo e a recepção dele foi a melhor possível. Ele vai se empenhar no sentido de que o governo encampe essa ideia e proponha ele mesmo esse projeto de reforma”, disse o magistrado após o encontro no Ministério da Justiça.
Pargendler reafirmou a necessidade da repercussão geral, uma vez que o STJ examina hoje questões de baixa relevância jurídica, como aplicação de multas de trânsito, por exemplo. “Um tribunal nacional, criado para uniformização do direito federal, não pode se ocupar dessas matérias”, ponderou o ministro.
Não houve fixação de prazo para encaminhamento da PEC, mas o presidente do STJ tem a expectativa de que isso seja feito o mais rápido possível, pois até que a repercussão geral seja instituída, será necessário um longo processo. Após a aprovação da proposta, será necessária a elaboração e aprovação de lei regulamentando seu funcionamento.
Resistência
Quanto à contrariedade da Ordem dos Advogados do Brasil à proposta, Ari Pargendler afirmou que sempre há resistência a novas ideias. “Essa resistência também aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal adotou o regime da repercussão geral. Hoje essa resistência se exauriu em função dos bons resultados que esse novo instituto teve no âmbito do STF”, avaliou o ministro.
Na advocacia, há quem considere o recurso repetitivo uma ferramenta suficiente para filtrar a entrada de processos. Mas o presidente do STJ entende que não. “O recurso repetitivo foi um grande avanço porque ele impede o acesso ao tribunal de questões que já foram resolvidas antes. Mas ele não inibe que cheguem ao tribunal recursos em relação a causas que realmente podem ser decididas no âmbito dos tribunais locais”, comentou.
Pargendler tenta tranquilizar aqueles que acreditam que será fechada uma porta aos jurisdicionados. “A proposta vai ser detalhada mais tarde em lei, e com certeza o legislador terá todo o cuidado de evitar qualquer óbice ao acesso à jurisdição. Agora, é muito importante que o STJ dedique o seu trabalho às causas realmente relevantes e que tenham uma repercussão geral”, explicou o ministro.
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EM ANDAMENTO
Julgamento sobre meios para atestar embriaguez de motorista é novamente interrompido
O julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que vai definir os meios de prova para atestar a embriaguez de motoristas foi novamente interrompido. Dos oito magistrados votantes na Terceira Seção, quatro já se manifestaram no sentido de que, à falta do exame de sangue e do etilômetro (bafômetro), outros meios de prova podem ser admitidos em juízo, de acordo com o voto do relator, ministro Marco Aurélio Bellizze. As posições podem ser alteradas até o fim do julgamento.
O ministro Sebastião Reis Júnior pediu vista dos autos, depois que foi contestada por dois ministros a validade deste processo como representativo de controvérsia repetitiva (a tese firmada no rito dos recursos repetitivos fixa parâmetros para a solução de outros recursos que tratem da mesma questão jurídica).
O julgamento, que começou no dia 8 de fevereiro, foi retomado com o voto da ministra Laurita Vaz. Ela acredita que o caso concreto relacionado ao processo em julgamento não deve ser considerado para fixação de uma tese repetitiva. No mesmo sentido se manifestou o ministro Og Fernandes, que defendeu, em questão de ordem, a remessa do recurso à Quinta Turma, para que continue tramitando em rito normal, não mais como recurso repetitivo.
No recurso interposto no STJ, o Ministério Público se opõe a uma decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que beneficiou um motorista que não se submeteu ao teste do bafômetro. O motorista se envolveu em acidente de trânsito em março de 2008, quando a Lei Seca ainda não estava em vigor, e à época foi preso e encaminhado ao Instituto Médico Legal, onde um teste clínico atestou o estado de embriaguez.
Ação trancada
Denunciado pelo MP com base no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o motorista conseguiu o trancamento da ação penal sob a alegação de que não ficou comprovada a concentração de álcool exigida pela nova redação da norma trazida pela Lei Seca. O tribunal local entendeu que a lei nova seria mais benéfica ao réu, por impor critério mais rígido para a verificação da embriaguez, devendo por isso ser aplicada a fatos anteriores à sua vigência.
A ministra Laurita afirmou que a lei nova estabeleceu um patamar mínimo de teor alcoólico no sangue. “Por um lado, a lei nova trouxe critério objetivo, sendo mais branda porque, antes, qualquer limite caracterizaria o crime. Mas por outro lado, é mais gravosa, por dispensar o perigo concreto a outrem como requisito para caracterizar o tipo penal”, explicou.
Para a ministra, no caso concreto, que se deu antes da Lei Seca, a perícia não determinou o grau de embriaguez do acusado, o que torna inviável o prosseguimento da ação penal. “No caso, não se pode ultrapassar a barreira da ausência de justa causa, para discutir objetivamente se há concentração alcoólica no organismo do motorista no grau determinado por lei”, destacou em seu voto.
A ministra defende que a discussão da tese a ser aplicada a todo o país seja retomada no julgamento de outro recurso, a ser destacado no futuro para julgamento na Seção.
Prova pericial
O ministro Jorge Mussi votou na sequência e acompanhou o entendimento do relator. Ele afirmou que, como a lei indica uma série de medidas às quais o motorista suspeito de estar alcoolizado deveria se submeter, e não havendo hierarquia entre elas, aquelas que não demandassem intervenção corporal, que não exigissem a participação ativa do suspeito, seriam produzidas com garantia do direito ao silêncio.
O ministro considerou possível, diante dos indícios do crime de embriaguez ao volante, a submissão do motorista ao exame clínico, a ser feito por perito médico, “prova que reputo tão confiável quanto aquela produzida pelo exame de sangue ou o bafômetro”.
No caso em exame, a embriaguez foi atestada por médico legista do IML, o que, para o ministro é prova apta a preencher o elemento objetivo do tipo penal. Portanto, segundo ele, é plenamente viável o recebimento da denúncia e o prosseguimento da ação penal.
“A prova pericial não é o único meio para comprovar o estado de embriaguez. Até porque vige o livre convencimento do magistrado, e ele não está comprometido pela prova, devendo apenas declinar as razões do porquê de optar por tais e não outras. Caberá ao magistrado cotejar as provas existentes e decidir pelo cometimento ou não do crime”, concluiu o ministro.
Questão de ordem
O seguinte a votar, ministro Og Fernandes, propôs, em questão de ordem, que o recurso seja remetido para a Quinta Turma para julgamento sem os efeitos de recurso repetitivo. No seu entender, o recurso afetado à Seção não é representativo da controvérsia. Os fatos narrados no recurso ocorreram em data anterior à Lei Seca e o motorista não se negou a fazer o teste do bafômetro (o teste não era exigido à época). “Estaríamos fixando uma tese jurídica incapaz de incidir sobre o caso concreto”, advertiu.
Com o relator, já votaram os ministros Gilson Dipp, Jorge Mussi e o desembargador convocado Vasco Della Giustina. O desembargador convocado Adilson Macabu entende que a tese repetitiva deve admitir apenas o exame de sangue e o bafômetro para caracterização da embriaguez. A retomada do julgamento está prevista para 28 de março, quando a Seção volta a se reunir.
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