sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Uma aula sobre o Exame da OAB: palavras de quem conhece

Completando um ano de blog, duas matérias de interesse público, direta ou indiretamente: o primeiro, artigo escrito pelo Mestre Miguel Reale Júnior, sobre a necessidade do Exame da OAB; o segundo, de autoria do presidente da OAB/RJ, Wadih Damous, no que tange ao sigilo dos documentos (projeto de lei sobre acesso a informações públicas).

Vale ressaltar que, no segundo caso, o PL sofreu alteração de quem? Nada mais, nada menos do que de Fernando Collor (será aquela EXXXX presidente que sofreu impeachment?) Será que ele ou alguns (s) de seus 'amigos' têm algo a esconder da sociedade?

SEÇÃO OAB
Todos os textos são retirados dos informativos do Conselho Federal da OAB.
Artigo: Exame de Ordem 
São Paulo, 13/09/2011 - O artigo "Exame de Ordem" é de autoria do ex-ministro da Justiça, Miguel Reale Júnior e foi publicado na edição do dia 3 de setembro deste ano no jornal O Estado de S. Paulo:

"A vida desenrola-se regida pelo Direito. O velho brocardo "onde está a sociedade está o direito" é absolutamente verdadeiro, pois as relações entre as pessoas e entre estas e o Estado são reguladas por regras jurídicas.

O Código Civil enuncia que toda pessoa é capaz de direitos e deveres e a Constituição lista os direitos e deveres individuais, além dos direitos sociais e políticos. Assim, a vida de qualquer cidadão está regida pelo Direito.

Conhecer esses direitos, bem como os deveres decorrentes, é essencial na vida comum de todo cidadão. Esclarecimento acerca dos limites do exercício de direitos e do cumprimento dos deveres é tarefa própria do advogado, ao qual cabe bem diagnosticar a situação concreta apresentada e dar a orientação correta. Um conselho certo evita prejuízos, afasta conflitos desgastantes e permite a conciliação.

Se for necessário pleitear em juízo a satisfação de uma pretensão legítima, é preciso enquadrá-la na ação judicial apropriada à espécie perante o juízo competente e de forma compreensível, tarefa essa exclusiva do advogado. O advogado realiza, portanto, trabalho de interesse geral, como veículo de efetivação da justiça, a ser alcançada pelo modo menos gravoso.

Assim, para advogar é necessário estar o formando devidamente qualificado, não bastando ter sido aprovado por uma das 1.174 faculdades existentes no País, que não formam juízes, promotores, delegados, advogados, mas apenas bacharéis em Direito em cursos, na sua maioria, cada vez mais deficientes, que não buscam excelência, e sim clientela e lucro.

Em Portugal editou-se o Regulamento Nacional do Estágio, em vista da diminuição generalizada da qualidade do ensino, com a degradação da profissão do advogado, razão pela qual cabe à Ordem zelar pela formação e valorização profissional, obrigando-se ao bacharel estagiar por dois anos em escritório de advocacia, para garantir conhecimento adequado de aspectos técnicos e éticos da profissão, ao final dos quais é submetido a exame de avaliação.

Em França o bacharel em Direito presta concurso para ser admitido em curso organizado pela Ordem dos Advogados com duração de 18 meses, durante os quais estuda o estatuto e a ética profissional, além de temas jurídicos, com período final de estágio junto a um advogado, após o que se submete a exame.

Na Itália o bacharel em Direito deve realizar dois anos de prática forense após se laurear, tempo após o qual pode vir a prestar exame de habilitação profissional.
No Brasil há hoje 700 mil advogados. Quando do recadastramento em 2004 havia 420 mil, o que significa que o número de advogados cresceu 70% em sete anos, mesmo com a exigência do Exame de Ordem. Nas 1.174 faculdades de Direito há 700 mil estudantes. Surgem com diploma de bacharel em Direito na mão cerca 100 mil pessoas por ano.

Em 1963 criou-se o Exame de Ordem, que poderia ser substituído por estágio do ainda estudante em escritório de advocacia cujo titular tivesse cinco anos de inscrição na Ordem. Na ditadura, em 1972, sendo ministro da Educação o coronel Passarinho, extinguiu-se o Exame de Ordem e se permitiu que o estágio fosse realizado nas próprias faculdades, que atestariam o aproveitamento do aluno para inscrição na Ordem dos Advogados. Criava-se nova fonte de renda para as faculdades particulares e desprestígio para a classe que constituía o bastião de resistência democrática.

Em 1994, novo Estatuto da Ordem reinstalou a exigência do exame para admissão nos quadros da advocacia. Agora, um bacharel reprovado interpôs, por meio de advogado, mandado de segurança no qual argumenta ser inconstitucional o Exame de Ordem, pois afronta o artigo 5.º, XIII, da Constituição, que garante o livre exercícM,io de trabalho e de escolha profissional. Na verdade, esse inciso condiciona o livre exercício de trabalho ao atendimento das "qualificações profissionais que a lei estabelecer".

A arguição de inconstitucionalidade foi rejeitada em primeira e segunda instâncias, mas agora chega ao Supremo Tribunal Federal em recurso extraordinário. O parecer do Ministério Público Federal é pela acolhida da inconstitucionalidade do Exame de Ordem, pois seria uma forma de limitar um mercado de trabalho reconhecidamente saturado, havendo perigosa tendência a reserva de mercado.

Em gritante contradição, o parecer do Ministério Público admite a "notória deficiência do ensino jurídico no Brasil" e propõe, reeditando a solução do coronel Passarinho ao tempo da ditadura, a adoção dos Núcleos de Prática Forense, previstos em portaria e resolução do Ministério da Educação, de responsabilidade das próprias faculdades, com professores do curso.

Contraditoriamente, o parecer confessa a necessidade de se restringir o acesso à profissão de advogado mediante a chancela da OAB, a fim de que da atuação de bacharéis não decorram "riscos à sociedade ou danos a terceiros". Propõe, todavia, que essa chancela se faça mediante impossível supervisão pela Ordem dos Núcleos de Prática Forense mantidos pelas próprias faculdades com seus professores. Ora, nenhuma faculdade vai considerar o seu bacharelando inapto para o exercício da advocacia: é a raposa cuidando do galinheiro. O núcleo gerará renda e passará também a ser fonte de falso prestígio da faculdade.

Se o Ministério Público, com razão, reconhece a possibilidade de risco para a sociedade com o ingresso automático de bacharéis na OAB, é evidente que a exigência de qualificação por via do Exame de Ordem não pode ser vista como expediente de reserva de mercado. É, sim, um meio de proteção da sociedade, do interesse de todos, do Judiciário e da própria democracia, pois a OAB tem por finalidade a defesa da ordem constitucional e sua força promana do prestígio social, a não ser comprometido com a inclusão de manifestos incompetentes em seus quadros."


Artigo: Na contramão da democracia 


Rio de Janeiro, 14/09/2011 - O artigo "Na contramão da democracia" é de autoria do presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, Wadih Damous, e foi publicado na edição de hoje (14) do Jornal do Commercio (RJ):

"Na contramão do texto aprovado na Câmara dos Deputados e nas comissões do Senado pelas quais já tramitou o projeto de lei de acesso a informações públicas (PLC 41/2010), a senador Fernando Collor insiste, como relator da matéria na Comissão de Relações Exteriores, na prorrogação indeterminada do sigilo de documentos classificados como ultrassecretos.
A intenção do ex-presidente, que em seu substitutivo alterou diversos dispositivos do projeto original, se choca também com o desejo da sociedade, comprometida com o fim do sigilo eterno para qualquer documentos. E representa um retrocesso nos avanços para que se tenha um Estado mais transparente aos seus cidadãos.

Antes refratários à imposição de limite de tempo para tais documentos - 25 anos prorrogáveis por mais 25, no máximo - setores militares e diplomáticos, assim como a presidente Dilma Roussef em determinado momento, já aceitam argumentos sobre a irrazoabilidade de ser mantido, no Brasil, um mecanismo mais identificado com regimes menos democráticos. Cinquenta anos foram considerados um prazo aceitável para salvaguardar de riscos o Estado e a sociedade.

Mas, pontifica o ex-presidente em seu relatório, "ainda que décadas, séculos passem, há atos dos Estados que devem permanecer sob a égide do sigilo, pois o tempo dos Estados não é o tempo dos homens". E ele quer ainda mais do que manter o sigilo eterno de documentos ultrassecretos.

Em seu substitutivo, Collor endurece as restrições ao propor que as informações de interesse público, em vez de divulgadas independentemente de solicitação, sejam acessíveis apenas por requisição obrigatória. E o requisitante terá que justificar o pedido de informação, condição inexistente no texto original.

O senador demonstra pouco apreço ao anseio da sociedade por um Estado mais acessível e sem receio da própria história em sua inteireza, com momentos honrosos ou não."

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